“Todos querem ser o Warren Buffet, mas a grande maioria não quer ter a paciência que ele teve”.
Inicio esta Carta podendo cometer um erro de referência e exatidão. Acredito que tenha escutado a frase acima em uma das entrevistas ou podcasts que o gestor de fundos da Constellation, Florian Bartunek (o qual admiro), participou. Não posso afirmar que está demonstradaipsis litteris, todavia posso cravar que a ideia está fielmente representada.
Florian Bartunek
um dos mais renomados gestores de fundos de investimentos do Brasil, está à frente da Constellation Asset desde 2002. Iniciou sua carreira no Banco Pactual, depois seguiu para o Banco Garantia – onde iniciou a parceria com Jorge Paulo Lemann (fundador do Garantia) sendo designado para gerir um fundo criado para investir a fortuna do banqueiro.
Não acredito que a paciência seja uma característica inata e exclusiva de algumas pessoas iluminadas com esse dom. Vejo como uma habilidade que pode ser aprendida, mas que demandará conhecimento dos nossos modelos comportamentais e das situações que enfrentamos, além de constante vigilância.
Paciência, em minha concepção, é o hiato entre a experiência de um evento e a reação que teremos.
Ao cultivarmos a paciência, estaremos aptos a excluir do nosso processo de tomada de decisão aquilo que esteja fora do nosso micro controle, propiciando uma trajetória com menor estresse, ansiedade e frustração, sentimentos extremamente prejudiciais aos resultados dos nossos portfólios.
Não é uma prática fácil, mas quando as nossas escolhas são conscientes e pautadas por uma sólida e disciplinada filosofia de investimentos, sistema de premissas que nos propicie uma margem de segurança em momentos adversos, a busca pela gratificação instantânea e a frustração por não a obter é substituída por uma visão menos distorcida (e talvez plenamente clara) sobre as oportunidades que os obstáculos nos oferecerão.
Warren Buffet é dessas pessoas hábeis na prática da paciência.
Para os que não possuem familiaridade com os expoentes do mercado de capitais, Warren Buffet, aos 90 anos de idade, é considerado o mais bem-sucedido investidor da história.
E, devido à experiência e à consistente entrega de resultados ao longo dos anos (entregou retornos superiores a 20% a.a. para os acionistas de sua empresa de participações), é chamado de Oráculo de Omaha (cidade onde nasceu, no Nebraska – EUA).
Warren Buffett
Investidor e filantropo americano, é o principal acionista, presidente do conselho e diretor executivo da Berkshire Hathaway.
Contudo, grandes feitos como esse não ocorrem ao final de um entardecer.
Conseguimos extrair do gráfico acima que Buffet iniciou no mundo dos investimentos aos 14 anos de idade, com cinco mil dólares. Acumulou o seu primeiro milhão dezesseis primaveras depois, aos 30 anos, e ultrapassou a marca dos cem milhões de dólares após 34 anos de seu começo, aos 48 anos de idade.
De sua fortuna total, mais de cem bilhões de dólares, 50% dela foi acumulada após os 80 anos de idade.
Nesse período vivenciou diversas crises, por exemplo:
No entanto, como podemos ver no gráfico, a sua trajetória continuou consistente, já que a sua filosofia de investimentos (seu sistema), a paciência e a disciplina fizeram com que o patrimônio crescesse continuamente. Para Buffet, as crises são oportunidades para comprar empresas fortes a preços baixos, e que o valor de longo prazo dos negócios continuaria a crescer, apesar da dor de curto prazo da crise.
Por isso, em sua visão, as más notícias são as melhores amigas dos investidores de longo prazo (aqueles que têm paciência para esperarem a maturação das estratégias e dos investimentos).
Nesse momento, você pode já ter questionado: Warren Buffet é único. Além da paciência e disciplina, ele tem uma habilidade prodigiosa para escolher boas empresas...
Não tenho como negar esse questionamento. É um fato que o Oráculo de Omaha possui capacidade técnica acima da média para definir em quais ativos investir. Entretanto, para o propósito desta Carta, excluí uma possível habilidade extraordinária de algum investidor e vou me ater somente à paciência e à disciplina.
E, para exemplificar a importância destas duas características, fiz um breve estudo:
Selecionei todas as empresas que fizeram IPO em 2007 (a escolha do ano é proposital, por ser imediatamente anterior à crise do subprime).
Ordenei todas e, sem repassar maiores informações, solicitei a um colega que escolhesse 20 números aleatórios, sendo que cada número corresponderia a uma empresa.
Assumi que foram investidos, no dia 01/01/2008, R$ 1.000,00 em cada empresa aleatoriamente escolhida.
Não foi considerado nenhum aspecto fundamentalista das empresas: a única premissa escolhida foi a aleatoriedade.
Simulei quanto os R$ 1.000,00 investidos em cada empresa teriam se tornado se tivéssemos mantido os recursos até o dia 21/04/2021.
Para fins de comparação, indiquei o quanto os R$ 20.000,00 totais teriam rendido caso a alocação fosse realizada integralmente no Ibovespa, índice que mede a performance do mercado de ações brasileiro.
Os resultados foram interessantes:
Essa carteira aleatória teria performance positiva e ainda superado o Ibovespa em 29,12% no período. Isso (i) sem nenhum tipo de acompanhamento de preços ao longo dos 13 anos que ficou investida, (ii) formada alguns poucos meses antes da crise de 2008 sem qualquer tipo de critério técnico, (iii) tendo passado também pela crise de 2020, e (iv)mesmo com algumas empresas apresentando resultados negativos.
A americana Annie Duke é uma das maiores jogadoras pôquer de todos os tempos, e se tornou referência em decisão comportamental e educação de decisão. Trecho retirado do livro “Thinking in Bets: Making Smarter Decisions When You Don't Have All the Facts” (traduzindo livremente: “Pensando em apostas: como tomar decisões mais inteligentes quando não se tem todas as informações”).
Repetimos o estudo com mais 5 combinações aleatórias, e em todas obtivemos resultados positivos e rentabilidade superior à do Ibovespa. As empresas vencedoras suplantariam com alguma margem de segurança os resultados das empresas perdedoras.
Se tivéssemos vendido as ações vencedoras, em um determinado período, por terem “subido demais”, teríamos amargado perdas no portfólio como um tudo.
E se tivéssemos sucumbido à performance das ações perdedoras e desistido das nossas escolhas como um todo, também teríamos deixado de obter uma rentabilidade acima da média de mercado com a estratégia assumida.
A paciência é capaz de corrigir grande parte dos nossos erros na escolha dos ativos.
Se uma escolha a esmo, sem nenhum fundamento técnico, deu resultados positivos no longo prazo (aqui traduzido por paciência e disciplina), é factível pensarmos que seguir a nossa filosofia para a escolha das empresas teria resultado em performance ainda mais consistente.
Essa filosofia está representada nas premissas citadas na Carta Modernidade Líquida ↗ e que repito abaixo:
A americana Annie Duke é uma das maiores jogadoras pôquer de todos os tempos, e se tornou referência em decisão comportamental e educação de decisão. Trecho retirado do livro “Thinking in Bets: Making Smarter Decisions When You Don't Have All the Facts” (traduzindo livremente: “Pensando em apostas: como tomar decisões mais inteligentes quando não se tem todas as informações”).
Esse estado de conhecimento, por sua vez, é uma variação de assumirmos que não temos certeza sobre tudo.
Portanto, tendo em vista todo o exposto acima, o que os investidores precisam, parafraseando Warren Buffet,
“…é a capacidade de ignorar os temores ou entusiasmos da multidão e se concentrar em alguns fundamentos simples. A vontade de parecer sem imaginação por um longo período - ou mesmo de parecer tolo - também é essencial”.